No início deste ano um pesquisador norte-americano realizou um feito que pode se tornar um marco na criação e elaboração de estruturas em escala nanométrica: a integração entre organismos vivos e materiais inorgânicos para movimentar uma máquina.
A pesquisa, produzida por Carlo Montemagno, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, foi publicada na primeira edição deste ano da revista Nature Materials.
Montemagno conseguiu, com sucesso, fazer com que um equipamento inorgânico, literalmente "pernas" mecânicas feitas de silício, plástico e ouro, e células musculares vivas, capazes de se contrair e relaxar, trabalhassem juntos, formando uma estrutura única com apenas 138 micrômetros (milionésimos de metro) de comprimento. Outra estrutura, também criada pelos cientistas, parece-se com pernas de sapo ao realizar movimentos de abertura e fechamento.
O "nanorobô" criado pelos cientistas consegue dar "passadas" de 25 micrômetros. Pode não parecer muito à primeira vista mas, para equipamentos com medidas da ordem de milionésimos de metro, é mais que suficiente.
Além disso, outras aplicações incluem a criação de micro-geradores de energia elétrica para processadores em escala nanométrica, e equipamentos que possam medir a força desenvolvida por células musculares diversas com precisão muito superior aos equipamentos existentes.
A equipe de pesquisa em nanotecnologia de Montemagno já era conhecida por reproduzir em laboratório "soluções" encontradas na natureza, como micro motores formados por moléculas, capazes de transportar outras moléculas. O problema, dizem os pesquisadores no artigo, "é que seriam necessários milhões deles para produzir atividade significativa". Auto-organização Para construir a máquina, o pesquisador utilizou células cardíacas de ratos como ferramentas de movimentação do robô, colocando-as sobre uma estrutura formada por silício e ouro. Um dos problemas enfrentados era a integração entre um organismo vivo e uma estrutura física inorgânica. Para conseguir o feito, Montemagno utilizou uma camada intermediária entre as células e a estrutura de silício.
Composta por material orgânico, a camada permitia a melhor fixação e organização das células musculares em sua superfície. Além disso, a presença desta camada impedia a proliferação das células fora do espaço delimitado a elas no "esqueleto" do robô. Assim, ao serem colocadas sobre o material, as células musculares adaptaram-se ao novo meio e organizaram-se de maneira uniforme, em um processo conhecido como "auto-organização". As células musculares reorganizaram-se, multiplicaram-se e preencheram os espaços disponíveis.
A "auto-organização" das células é o que permite aos pesquisadores replicar o mecanismo inúmeras vezes, uma vez que é possível prever como ficará a disposição final do conjunto.
Para concluir, o conjunto foi colocado em uma solução capaz de dissolver a camada orgânica, restando apenas as células musculares e o "osso". Com isso, as células musculares ficaram dispostas em um feixe, e através de suas contrações a estrutura é capaz de se mover.
"O que se tem é um aparelho que possui um esqueleto e músculos que permitem que ele se mova", disse Montemagno. Os nanorobôs ficam imersos em uma solução contendo glicose e outros elementos necessários à sobrevivência das células.
Máquina viva
Como são predispostas à contração e relaxamento, as células musculares provenientes do coração de atos fazem com que as estruturas de Montemagno funcionem ininterruptamente. No entanto, segundo os cientistas, seria possível fazer robôs construídos com outros tipos de músculo, acionados por impulsos elétricos.
Em entrevista à rede britânica BBC, o cientista revelou que seu nanorobô, ao contrário de outras criações na área, não é apenas uma estrutura que se movimenta, mas sim uma máquina viva.
"Elas (as nanomáquinas) estão absolutamente vivas", disse o professor. "Quero dizer que as células realmente crescem, multiplicam-se e organizam-se, formando elas próprias a estrutura. Então o organismo está vivo", concluiu.
Brasil
No Brasil, as inovações em pesquisas integrando nanotecnologia e biotecnologia também já começam a aparecer. Este mês, por exemplo, os pesquisadores brasileiros ligados à Renami (Rede de Nanotecnologia Molecular e de Interfaces) apresentarão um projeto na Nanotech, feira mundial de Nanotecnologia, que ocorre em fevereiro no Japão.
A Renami é uma das redes temáticas de incentivo à pesquisa ligadas do Instituto do Milênio, programa do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT).
Liderado por Petrus D´Amorim, coordenador do Laboratório de Nanodisposistivos Fotônicos da Universidade Federal de Pernambuco, o projeto permite a avaliação da incidência de raios solares sobre trabalhadores através de um dispositivo chamado de n´Domp.
O n´Domp, ou Nanodosímetro Molecular de uso Pessoal, possui uma película que assemelha-se à pele e degrada-se sob a exposição a raios UV, e funciona como um registro pessoal de cada trabalhador.
As outras partes do equipamento serviriam para definir a dosagem de proteção necessária e para proteger o aparelho de interações com moléculas de água, que poderiam danificá-lo.
Segundo seus criadores, o n´Domp poderia ser instalado em um "crachá", podendo acompanhar o trabalhador onde ele estivesse.
24/01/2005
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