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Entrevista com Dra. Cintia Fridman - ProjetoCaminho de Volta

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1 - Quando e por quê nasceu o Projeto Caminho de Volta? 
A idéia do Projeto Caminho de Volta nasceu no final de 2003, no Departamento de Medicina Legal da FMUSP. Nosso Depto já tem tradição em trabalhar com DNA e Biologia Molecular para fins de identificação; além disso, possui um serviço de atendimento à famílias vítimas de abuso sexual (CEARAS) e uma equipe de Bioinformática.     O alarmante número de crianças desaparecidas por ano, no Estado de São Paulo, nos chamou atenção. Esse numero é de 8.000 crianças por ano! Assim, nosso projeto foi elaborado com o objetivo de auxiliar na identificação de crianças e adolescentes menores de 18 anos, utilizando os conhecimentos de diferentes áreas. O Projeto Caminho de Volta (PCV) foi lançado em 13 de setembro de 2004.  


2 – Como é seu funcionamento? 
O Projeto Caminho de Volta, conta com uma equipe de psicólogos que fica de plantão na Delegacia de Pessoas Desaparecidas, ligada ao DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), de segunda a sexta. 

As famílias que se encaminham à delegacia para lavrar o BO do desaparecimento de uma criança ou adolescente são apresentadas ao Projeto e perguntadas se gostariam de participar. Essas famílias respondem a um questionário, aplicado por esses psicólogos, que consta de dados sobre a criança, a estrutura familiar e as circunstâncias do desaparecimento. 

Esses questionários e entrevistas servem de base para o estudo causal que tem como objetivo identificar as causas do desaparecimento de crianças e adolescentes por meio da análise da organização familiar a que pertencem, uma vez que, a negligência,  a violência doméstica, o abuso sexual intrafamiliar, a miserabilidade e a contravenção podem ser aspectos facilitadores para a ocorrência de fugas de lares, seqüestro e rapto. 

O psicólogo marca 3 retornos para essa família na delegacia, para um acompanhamento psicossocial, com o objetivo de identificar essa organização familiar e poder encaminhá-la para serviços de acompanhamento psicológico especializados. O suporte psicológico também é fundamental no término da busca desta criança ou deste adolescente desaparecido, ou seja, no momento em que a família possui uma resposta, seja ela positiva ou negativa.

Assim que a família adere ao Projeto, os indivíduos assinam um Consentimento Livre e Esclarecido para que seja aplicado o questionário e coletado material biológico. É coletada uma gota de sangue e raspado de mucosa oral das famílias para compor o Banco de DNA (Banco Referência). Quando uma criança sem parentesco é encontrada e não se tem meios de fazer o reconhecimento visual (em caso de morte ou envelhecimento), é coletado material biológico dessa criança, que fará parte do Banco de DNA Questionável.     Esses dois Bancos se cruzam automaticamente, na tentativa de encontrar, por meio do perfil de DNA, a família dessa criança. Assim, toda nova família que entra no Projeto e que é feito o perfil genético, os dados são cruzados com o Banco das crianças e, toda vez que uma criança é encontrada há um cruzamento com o Banco referência.   

Outra abordagem do Projeto Caminho de Volta (PCV) é realizar a capacitação de profissionais envolvidos no sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente (Poder Judiciário, Ministério Público, conselheiros tutelares, investigadores e agentes de polícia envolvidos na busca e investigação, psicólogos, assistentes sociais, delegados, educadores das organizações não governamentais), por meio de cursos presenciais e educação à distância (Telemedicina), garantindo um acompanhamento contínuo e supervisionado, com o objetivo de expansão do projeto para outras cidades.  


3 - Quem pode ter acesso a ele e como fazê-lo? 

Qualquer família que tenha perdido seu filho enquanto o mesmo ainda era criança ou menor de 18 anos. 
 

4 - Qual o mínimo grau de parentesco exigido para que amostras de DNA sejam comparadas com o material das pessoas desaparecidas?  Temos preferência por coletar o material biológico dos pais da criança em questão. No caso de ausência dos pais, os irmãos biológicos são importantes. Depois desses, meio-irmãos(ãs), tios (as), avós, de preferência do lado materno da família.

  
5 - Para a análise dos dados apurados, provenientes dos sequenciamentos de DNA, geralmente são utilizados softwares específicos para cada finalidade, os quais pertencem à área da Bioinformática. De que forma o Projeto Caminho de Volta se utiliza desta ciência? Há alguma particularidade relevante?  

A equipe de Bioinformática do Projeto Caminho de Volta desenvolveu um software capaz de fazer esses cruzamentos de dados de DNA e dos Dados dos questionários entre os Bancos Referência e Questionável de forma ágil e precisa. 


6 - Os moldes do Projeto Caminho de Volta já foram utilizados anteriormente?   Não temos conhecimento de nenhum outro Projeto que reúna diferentes disciplinas com o objetivo de ajudar a solucionar casos de crianças desaparecidas. Existem programas que trabalham apenas com a identificação desses indivíduos por DNA, mas que não possuem o caráter psicossocial do nosso projeto, que tem relevância social e preventiva.


7 - Como está o andamento do projeto atualmente e quais são os próximos passos para seu aprimoramento?   Nossa equipe tem feito capacitações em outras cidades do Estado de SP, em delegacias do interior (DEINTER) para a implantação do Projeto Caminho de Volta. O Projeto já está funcionando em Bauru, São José dos Campos, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Presidente Prudente, Campinas e Sorocaba. A próxima capacitação será na DEINTER de Santos. 


8 - Quantas famílias estão cadastradas no projeto e qual seu perfil?  Atualmente temos 173 famílias cadastradas e todas já possuem o perfil de DNA no Banco Referência. 


9 - Quais os meios de comunicação utilizados para a divulgação do projeto junto à população?   O Projeto tem sido divulgado em jornais, revistas, televisão e rádio.


10 - Qual o índice de crianças e adolescentes identificados pelo projeto?  O Projeto ainda não identificou nenhuma criança, pois para se realizar a coleta de material biológico de crianças e menores de 18 anos é necessário o consentimento de um responsável. Nesse caso, os responsáveis por essas crianças são os juízes das Varas da Infância e Juventude. O Projeto Caminho de Volta conseguiu recentemente autorização da Corregedoria Geral da Justiça para coleta de material de crianças que se encontram em abrigos e que não possuem filiação conhecida ou que possuem filiação duvidosa.    


11 - O número de famílias cadastradas tem atingido as expectativas?   Na verdade, o Projeto só tem recebido adesão de casos novos, ou seja, aqueles que estão indo à delegacia para fazer o BO de casos recentes de desaparecimento. Estamos à espera da demanda reprimida, que são aquelas famílias que perderam seus filhos há algum tempo e que já possuem o Boletim de Ocorrência. Essas famílias também são candidatas a entrar no projeto e podem entrar em contato com o DHPP (tel: 3311.3444 / 3311 .3262) ou com o PCV (tel: 3085.9677).  


12 - Na sua opinião, qual a importância do uso de novas tecnologias (pertencentes à Biotecnologia) para o auxílio na identificação de pessoas desaparecidas, especialmente crianças?  As novas tecnologias, principalmente de Biologia Molecular e Bioinformática, são de extrema importância pois permitem a identificação rápida e precisa dessas crianças e o cruzamento dessas informações com as das famílias cadastradas. 


13 - Quais os benefícios que um projeto específico, como este, pode trazer para a sociedade em geral?  Esperamos que a partir dos estudos das causas desses desaparecimentos seja possível estabelecer medidas de prevenção e de políticas públicas para que esse número seja reduzido o máximo possível.  

 

 

19/09/2005
Biotec AHG
 

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