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Células-Tronco, o dilema

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O dilema das células-tronco

Em 12 de fevereiro deste ano, uma equipe de pesquisadores da Universidade Nacional de Seul, na Coréia do Sul, anunciou ter conseguido clonar mais de 30 embriões humanos para produzir células-tronco. O grupo, liderado pelo pesquisador Woo Suk Hwang, extraiu o material genético de células somáticas  de doadoras e o combinou com seus óvulos, que desenvolveram-se até um estágio no qual já é possível retirar deles as células-tronco. No processo, o grupo coreano retirou todo núcleo e o DNA contido nos óvulos das doadoras e inseriu neles o núcleo e o DNA de uma célula somática adulta, proveniente da mesma paciente que forneceu o óvulo.

Além de conseguir pela primeira vez na história clonar células humanas adultas, trazendo a certeza de que a obtenção de células-tronco é um fato real, o feito da equipe de Hwang acabou trazendo à tona a possibilidade de se desenvolverem terapias genéticas que possam ajudar a curar doenças degenerativas, como o Mal de Alzheimer, diabetes, osteoartrite, entre outras. 

De um modo geral, por sua capacidade de se especializar e se “transformar” em qualquer outra célula ou tecido do corpo humano, as células-tronco atuariam no local da doença, adaptando-se e restabelecendo o funcionamento normal do órgão ou tecido ao qual estaria ligada.    De acordo com Hwang, nenhuma pesquisa no mundo conseguiu desenvolver óvulos clonados até este estágio, e ninguém havia afirmado ter conseguido um número tão grande de embriões clonados. A pesquisa contou com a participação de 16 mulheres, que doaram 242 óvulos para, juntamente com o material genético de células somáticas, gerar os embriões. Desse total, 30 embriões foram colocados em cultura até atingir o estágio de blástula, estágio no qual as células-tronco já podem ser extraídas.    Junto com os benefícios, para a opinião pública mundial, a conquista trouxe à tona a questão da clonagem de embriões. Apesar disso, Hwang, líder da equipe, deixa bem claras as intenções da pesquisa: “Nunca tentaremos produzir seres humanos clonados", disse. “Nosso trabalho abre caminho para o uso dessas células na medicina”. O pesquisador e sua equipe, antes de realizarem a clonagem dos embriões, submeteram o trabalho à avaliação de um Comitê de Ética da própria Universidade Nacional de Seul, além de contar com a aprovação prévia de todas as mulheres que doaram óvulos para a pesquisa.    


A questão ética

Para que consigam obter células-tronco para seus estudos, os pesquisadores ao redor do mundo têm recorrido a três diferentes técnicas: a retirada de amostras da medula óssea de um indivíduo, a obtenção de células à partir do sangue contido no cordão umbilical de um recém-nascido, e através de embriões ainda em estágio inicial de desenvolvimento.

Enquanto as duas primeiras formas de obtenção não apresentam contradições quanto às questões éticas de pesquisa científica, a obtenção de células-tronco à partir de embriões causa polêmica em todo o mundo. O motivo: a utilização (e conseqüente destruição) de óvulos já fertilizados, que poderiam gerar um indivíduo, e a possibilidade de clonagem de seres humanos, é questão que já movimenta polêmicas há vários anos.    Algumas células-tronco são totipotentes, ou seja, podem transformar-se em qualquer outro tipo de célula existente no corpo humano. Outras, no entanto, são apenas multipotentes, podendo gerar células e tecidos de algumas partes, mas não de todo o organismo.     Acredita-se que justamente as células embrionárias sejam, de fato, totipotentes, daí sua importância para os pesquisadores. Alguns estudos alegam ser possível obter células-tronco não embrionárias totipotentes, mas ainda não provaram, de forma conclusiva, suas teorias.

Por esse motivo, governos e comunidades científicas tem discutido profundamente essa questão. No momento, vários países elaboram leis regulamentando o trabalho científico com embriões, inclusive o Brasil.

No país, o projeto de lei de biossegurança proíbe o uso de embriões humanos, o que vêm causando preocupação e discussões em âmbito nacional entre políticos, pesquisadores e a comunidade em geral. Pela legislação atual, não é permitido no Brasil utilizar embriões humanos para pesquisas científicas. Agora, o projeto de lei que deverá regulamentar a pesquisa em biotecnologia ainda pode sofrer modificações, e é uma das poucas chances de se conseguir legalizar o uso destas células na pesquisa científica.    Nos Estados Unidos, onde a pesquisa com embriões já é permitida, o governo Bush proibiu o uso de verbas federais para a obtenção de novas linhagens de embriões para as pesquisas, obrigando Institutos e Universidades a recorrerem a doações de embriões, ou à iniciativa privada. A universidade de Harvard, inclusive, recebeu recentemente uma doação de embriões do Hospital de Boston, demonstrando o interesse de ambas as instituições na continuidade das pesquisas.

Enquanto isso, países como a China, em que a clonagem de embriões para pesquisas é permitida, avançam cada dia mais em seus estudos. Na Coréia do Sul, a pesquisa apresentada pelo Dr Hwang demonstra que os avanços já permitiram a clonagem, com sucesso, de embriões humanos para fins terapêuticos.  

 
O progresso das pesquisas

As pesquisas com células-tronco buscam respostas para curar diversos tipos de doenças, principalmente as degenerativas, como o Mal de Alzheimer. Além disso, abre caminho para a criação de tecidos e órgãos para serem transplantados. 

No Brasil, uma pesquisa realizada em âmbito nacional coordenada pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) em Salvador demonstrou a eficácia no uso de células-tronco para recuperar os músculos do coração danificados em função de isquemias e Doença de Chagas. Além disso, a técnica custa 10% do valor de um transplante e pode beneficiar, só no país, cerca de 3 milhões de habitantes.

Em outra pesquisa, realizada por pesquisadores da Duke University, na Carolina do Norte (EUA), foi comprovada a ação das células-tronco de um doador para o tratamento em outra pessoa. Na ocasião, foram retiradas células do cordão umbilical de uma recém nascida e utilizadas para tratar um menino.O garoto sofria de uma rara doença degenerativa, e as células-tronco foram usadas para reparar partes danificadas do coração do garoto. Apesar da morte do paciente algum tempo depois, em função de uma infecção hospitalar, uma autópsia revelou a eficácia do tratamento. Apesar disso, ainda são incertos todos os benefícios que a utilização de células-tronco podem trazer para o tratamento e cura das patologias humanas. A questão principal que se coloca neste momento, no entanto, não é esta. A discussão é se governos, pesquisadores, médicos e a sociedade em geral devem ou não permitir o avanço dos estudos com células-tronco embrionárias, e de que forma isso deve ocorrer. 
 
   
14/03/2004
 

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